domingo, 22 de abril de 2012

Into the wild - A versão portuguesa do fotógrafo Rúben Neves

Encontramos Rúben Neves num jardim, algures em Lisboa, num dia de sol, para falar de «bichos». E fomos visitados por alguns deles durante a conversa, o que fazia com que o fotógrafo desviasse a atenção das palavras para registar essas «visitas» com o seu olhar.

A fotografia da natureza é o espaço onde Rúben Neves se perde e se encontra: «é tudo tão natural e genuíno, é quase um momento egoísta, pois o que “ganho” com estes momentos é maior do que aquilo que posso dar». Egoísmo? «Sim, muitas vezes fotografo só com o olhar e acabo por não registar momentos que nem sequer consigo descrever em palavras».

É um olhar sorridente aquele que encontramos ao ouvir as estórias de Rúben, nos seus momentos de fotografia, em ambiente natural. Gerês, Escócia, Lousã, Serra de Cazorla, Sintra – da costa portuguesa ao Alentejo, Rúben acumula já alguns quilómetros na companhia das suas máquinas e objectivas, em busca do momento irrepetível. Se há expedições que exigem alguma investigação a nível do local e das espécies que nele se podem encontrar, outras há que exigem do fotógrafo apenas a disponibilidade para viver momentos de contemplação da «bicharada».

Contemplar certos e determinados momentos na natureza é um luxo. A partilha que a natureza apresenta para connosco, ao permitir a presença de um estranho (o fotógrafo) no seu espaço é de uma generosidade indescritível. Ao longo da conversa, Rúben sublinha a amabilidade de uma natureza que pouca gente conhece e que é profundamente rica. «Temos o paraíso mesmo aqui à mão de semear, por exemplo, no Gerês».

E temos também encontros para quem desenvolve trabalho e projectos nesta área. Exemplo disso são os Encontros de Fotografia de Natureza e Vida Selvagem, cuja segunda edição teve lugar em Vouzela, em Janeiro último. Rúben Neves tem colaborado com este movimento, que se encontra a dar os primeiros passos, mas que tem vindo a conquistar reconhecimento junto das pessoas da área. Luís Quinta, Nuno Sá, Alexandre Vaz, João Cosme e José Benito Ruiz são alguns dos nomes que passaram por este encontro, para partilhar experiências.

«Sempre fotografei. Com os olhos.» – repetiu o Rúben. Já tínhamos ouvido esta expressão há pouco. Insistimos: fotografar com os olhos? Como assim? «Quando olho para o que está à minha volta, penso na forma de registar estes momentos, como se fossem fotografias. Mas eu não me assumo como fotógrafo.» (E aqui que ninguém nos ouve, Rúben, não há qualquer problema nisso desde que nos permitas a nós tratar-te como tal).
Falta-nos educação ambiental e massa crítica para discutir profundamente o que se faz em termos de fotografia da natureza. Esta apresenta todo um potencial ao nível daquilo que se pode partilhar com os outros em termos de perspectiva ecológica, da educação para a biodiversidade e para o respeito e compreensão daquilo que é o ambiente. A fotografia da natureza pode ser um meio pedagógico para que cada um de nós tome consciência das espécies animais que habitam o nosso mundo, sim, aquele mundo que está mesmo aqui a dois passos de nós.

E cada fotografia conta uma estória, diz-nos Rúben. Dos caminhos que se trilham até chegar àquele espaço, àquele habitat; da amizade que se constrói em cada expedição; do calor ou do frio que se enfrenta à espera que aquele animal nos diga um olá, à sua maneira.

Se há animal que Rúben não esquece, são os esquilos da Escócia. Pode dizer-se que é a sua «imagem de marca» enquanto fotógrafo da natureza. Tal como o esquilo, também Rúben tem os seus sentidos bem apurados quando se encontra em busca do momento ideal para fotografar: seja com o olhar ou com a objectiva. Sempre alerta aos movimentos (tal como o esquilo) é o Rúben que nos diz, durante a entrevista, perante o vôo inesperado de um pássaro: «já viste? Parece que adivinham que estamos a falar de bichos!»

fotografia de Rúben Neves

sexta-feira, 20 de abril de 2012

Da tragédia grega revisitada - AGAMÉMNON - vim do supermercado e dei porrada ao meu filho

Agamemnon foi (ou melhor, terá sido)  um herói grego, o rei de Micenas que comandou o cerco dos Aqueus à cidade de Tróia.Esquilo escreveu uma tragédia com este nome, que foi representada nas festas dionisíacas de Atenas (por volta de 458 a.C). Neste texto, Agamemnon regressa vitorioso,dez anos após a guerra de Tróia, ao lar onde Clitemnestra o aguarda para o assassinar, conforme combinado com o seu amante Egisto.

Na peça em cena no Teatro da EscolaPolitécnica, Gonçalo Waddington é Agamemnon, um herói dos dias de hoje que regressa a casa, após a guerra em plena cidade do consumo (um supermercado onde tudo se compra e em barda) e aplica um valente enxerto de porrada no seu filho. Sim, isso mesmo. Entre a tragédia e a esperança, Gonçalo Waddington dá vida (o que inclui alma e corpo) ao pai Agamemnon, provocador e provocante, que «pinta»grafitis com ketchup.

«E explico-lhe que a TRAGÉDIA começa com o mundo industrializado.» - ouvimos dizer, a dada altura. Otexto, de Rodrigo Garcia, apela a um olhar profundo sobre o mundo em que vivemos, onde uns se matam através da fast food e outros morrem porque não têmo que comer. Estes últimos, os portadores da esperança, são heróis agamemnonianos assassinados pelas próprias mulheres, tal como no texto de Ésquilo.

As crianças Alexandre Pires, HenriquePires e Martim Barbeiro assumem o papel de coro trágico, numa peça onde a música está presente, bem ao gosto de Friedrich Nietzsche. Estamos em crer que o autor de Assim falava Zaratustra iria aplaudir esta peça, onde a destruição nos surge como o palco para a criação de uma nova consciência, nascida da esperança de poucos contra o poder de muitos. Onde o sonho e o ímpeto dionisíaco se degladiam com as forças apolíneas presentes na acção do coro.



A peça esteve em cena no São Luiz, noano passado, tendo passado também por Almada e Coimbra.  Está em cena no Teatro da Escola Politécnica, para seis únicas representações (19, 20, 21, 26, 27 e 28de Abril, sempre às 21h).

segunda-feira, 2 de abril de 2012

Mais do que uma batalha, um encontro de tribos

Às 22h30m (e com 30min de atraso) entrou em campo a equipa Blasted Mechanism constituída por Guitshu (voz), Valdjiu (bambuleco, kalachakra, banjo-bandola), Ary (baixo), Syncron (bateria), Winga (percussões, didgeridoo) e Zymon (guitarra, sitar eléctrica, teclas). Do outro lado do campo (a Aula Magna de Lisboa) encontrava-se a equipa Blasted Generation, constituída por tribos diversas. A batalha consistia na apresentação do novo trabalho dos Blasted Mechanism, “Blasted Generation”, que se segue ao “Mind at Large” (2009). E o cenário previa-se como um ganhar/ganhar.
«Blasted Generation» foi a música que deu o mote de entrada para a banda que surpreendeu com um palco onde a estrutura concebida por Rui Gato nos presenteava com um video mapping que nos fazia viajar pelo “Blasted Empire”. Não falharam “hinos” como «Start to move» (com a presença de Agostinho da Silva) ou »When the sun goes down». O público cantava e sobretudo dançava. Aliás, assim que a banda entrou em palco, a maioria das pessoas levantou-se para saudar os seus membros e começar a dançar.
Ana Sofia Antunes é responsável pela roupa que a banda apresenta neste trabalho e que nos fascinou pelos seus pormenores de luz e forma, bem como pelas figuras que se criam em palco. Figuras míticas (míSticas?) que (en)cantam com sons de índole indiana e africana. Todo um apelo à dança, em harmonia com o cosmos, do primeiro ao último minuto.
A banda terminou o concerto com o tema «Puxa para cima», que é uma espécie de hino ao combate à crise, através da música. “Puxa para cima a tua energia” marcou a manifestação que, a 12 de Março de 2011, invadiu a Avenida da Liberdade, em Lisboa.
A Aula Magna não esgotou, mas o público abandonou o campo de batalha com o corpo esgotado da dança e a alma banhada em boas energias.
A banda vai apresentar o novo trabalho no Porto a 7 de Abril e em Angra do Heroísmo, a 30 de Junho.

domingo, 1 de abril de 2012

Evasion | da fuga para a frente, rumo à liberdade


Encontrámos Pedro Batista no seu atelier, em Lisboa, rodeado dos trabalhos que fazem parte da exposição Evasion, que será inaugurada no dia 29 de Março, na Rua Ivens 42 (Chiado, Lisboa). 

Evasion traduz-se mais numa intenção do que propriamente num conceito: «Não se descreve uma ideia, mas sim o expressar de uma emoção, da qual não se tem uma consciência total» - diz-nos Pedro. A exposição reflecte um ano de trabalho (aproximadamente) e traduz-se no terminar de um ciclo. «A exposição foi pensada por mim e escolhi Lisboa de forma a consolidar o mercado».  Como é que acontece o processo criativo? «Evasion é composta de pequenas histórias dentro de uma intenção. Da minha parte, há uma apropriação de imagens que consigo inserir no processo. E depois cada quadro é um quadro...» E cada um deles nos conta algo; bastava olhar para as paredes do atelier para nos sentirmos «invadidos» pela evasão (evasion) e pela intenção de liberdade presente nos quadros do Pedro. A liberdade e o movimento (só o movimento nos permite encontrar o «sítio certo») são intenções transpiradas por estes trabalhos. E a mudança? Também aqui é o movimento que nos fala da mudança, nestes trabalhos em que a figura e o fundo se diluem. «Cada trabalho é um raio x de uma perspectiva emocional. Em vez de ser uma máscara, é o que tu és. Imagina olhar-te ao espelho e não haver máscara.» 

Pedro Batista já expôs em Nova Iorque e a palavra que lhe surge ao falar da «cidade que nunca dorme» é liberdade. «Conheci pessoas do mundo inteiro, foi muito bom.»  Liberdade é, aliás, uma palavra que o artista repete algumas vezes durante o nosso encontro. A pintura é liberdade? «Sim, é liberdade».  A mesma liberdade que sentiu algures nos Açores, na Ilha Terceira, num encontro de street art onde, disse-nos, «tive o luxo de fazer um amigo, para além de pintar». 

«A arte é algo tão rico  e aquilo que a arte dá à sociedade é tanto que se não a acarinharmos é impossível ter uma sociedade livre, uma sociedade onde é possível ter e praticar a vontade de estar no sítio certo», diz-nos Pedro. 

Liberdade e evasão para o futuro. E a vontade de estar no sítio certo. Até 6 de Abril, o sítio certo passa algures pelo Chiado, onde podem conhecer os trabalhos do Pedro. 

fotografia de Mário Pires

 

sábado, 17 de março de 2012

Florbela | Da dor que nos faz sentir a vida.

Realizado por Vicente Alves do Ó, “Florbela” apresenta-nos a vida de Florbela Espanca (Dalila do Carmo), a poetisa portuguesa que quis «amar, amar, perdidamente». O filme faz-nos viajar até ao momento em que Florbela deixa o seu segundo marido, António Guimarães (José Neves), e volta a casar com Mário Lage (Albano Jerónimo).
Apeles Espanca (Ivo Canelas), o irmão, surge como o grande amor da sua vida, o pilar, o tecto, a janela, a porta da alma de Florbela; uma alma perdida a loucura de viver e o tormento. Tormento esse que se adensa após a morte de Apeles, num trágico acidente com um hidroavião, no rio Tejo.
«Escreve, Florbela» – é uma das frases que se ouve mais durante o filme. Um imperativo categórico que Florbela só consegue cumprir após um «apelo» do irmão, já morto. Na fronteira entre o sonho e a realidade, Florbela pega no lápis e começa a escrever. Não resiste à terceira tentativa de suicídio e aos trinta e seis anos abandona este mundo.
Florbela (ou Flor d’Alma da Conceição) não era uma mulher do seu tempo. Florbela ousava usar calças. Florbela casou e descasou, sofreu abortos e nunca teve filhos. Estava longe de pertencer ao Clube das Esposas Perfeitas e Dedicadas. Florbela não era feliz. «Não sei viver» – diz ela ao pai, após este a resgatar do fundo de um poço. Florbela amou, amou perdidamente. Florbela perdeu-se algures entre o ser e o tornar-se. Florbela é intemporal: pela escrita que nos deixou e pelas vidas que tocou.
O cinema português está de parabéns: esta obra brinda-nos com uma excelente realização e com um naipe de actores de grande estirpe, a quem a tela fica tão bem!

vergonha | Entre o amor de desejo e o desejo do amor.

Realizado por Steve McQueen, “Vergonha” conta-nos a história de um homem bem sucedido, bem parecido, que foge à rotina do quotidiano através do sexo. Entre a sedução e a pornografia, entre o one night stand e a prostituição, Brandon (Michael Fassbender) vê-se encurralado pela visita “súbita” da irmã, Sissy (Carey Mulligan), que lhe “invade” o apartamento em Nova Iorque.

Brandon não vê para lá do imediato prazer. Acumula revistas pornográficas. Acumula vídeos no seu computador. Brandon é um ávido consumidor de sexo. De mulheres. De si mesmo. De homens. Do sexo pelo sexo. Sem emoção, sem compromisso, sem entrega que vá para lá daquela noite.

É entre um borrego mal assado e um copo de vinho que Brandon vislumbra algo mais do que o seu dia-a-dia de imediatez. É perante uma irmã vertiginosamente atraída para a destruição que Brandon sente a vergonha de simplesmente estar e não ser capaz de ser.

“Vergonha” proporciona-nos uma viagem ao interior de nós mesmos, à culpa que se sente no prazer, ao sentimento de finitude pelo prazer que rapidamente acontece e desaparece. Talvez Brandon procure a eternidade da vida num momento de prazer, que insiste em repetir noite após noite, dia após dia. Uma eternidade instantânea, à distância de uma troca entre corpos onde o amor se incompatibiliza com o sexo e vice-versa. Brandon procura sexo. E devido a essa busca desenfreada, o amor acaba por lhe fugir por entre os dedos. E aí Brandon também sente vergonha.

O filme estreou no Festival de Veneza e Michael Fassbender foi galardoado com o troféu de melhor actor. Em Portugal, “Vergonha” abriu o Fantasporto a 24 de Fevereiro de 2012.

t

domingo, 19 de fevereiro de 2012

Detenção de risco (Safe House)

Ai s'eu te pego – na versão de Daniel Espinosa.


Poderia ter sido um dia como os outros, na vida de Matt Weston (Ryan Reynolds), um agente da CIA responsável por uma “casa de hóspedes”, na Cidade do Cabo, África do Sul. O destino guardou para Matt Weston aquilo que todos os agentes cansados da rotina poderiam desejar: receber Tobin Frost (Denzel Washington), um operacional da CIA procurado pela agência, tido como traidor. Talvez o destino tenha exagerado, pois este encontro mudou a vida de Matt e levou-o a questionar a sua postura na vida quotidiana e dentro da agência. Há um momento em que Matt compreende que não pode continuar a dizer à namorada que trabalha numa ONG: as marcas no seu rosto não lhe deixam mentir. Matt tem como missão perseguir Tobin Frost e entregá-lo, vivo, à agência.
O filme apresenta-nos um Denzel Washington muito eficaz, que agarrou o papel com a atitude de quem sabe o que faz. Não é a primeira vez que Denzel veste o papel do durão ou do mau da fita. E podemos dizer que lhe assenta muito bem. Denzel é exímio na postura física, no olhar, no sorriso – sim, o mau da fita tem um sorriso lindo. Ryan Reynolds cumpre com um papel de exigência física e de alguma tensão emocional: o agente defronta-se com questões relacionadas com a verdade e a mentira, no seio de uma agência como a CIA.
Daniel Espinosa, o realizador, apresenta-nos um filme que vai para a categoria “entreter sem comprometer”: o filme cumpre-se enquanto thriller típico sobre as teias da CIA que, a dada altura, cede ao imperativo de proporcionar boas cenas de acção e desinveste no argumento.
“Detenção de Risco” estreou nas salas portuguesas a 9 de Fevereiro.

Os Eléctricos | Tour de Inverno - uma banda em busca do melhor concerto... o próximo!


 
Os eléctricos fazem parte da estética da cidade de Lisboa. São um meio de transporte que nos permite viajar daqui para ali. Os Eléctricos fazem parte do mais recente panorama musical português. São um meio de transporte que nos permite viajar até aos anos 50. «Imagina que nós, músicos,  com o know how do presente, somos capazes de viajar até aos anos 50. Como seria uma banda dessas?» - pergunta Miguel Castro. Essa banda chama-se Os  Eléctricos. E se eles têm electricidade para dar e para vender!
O primeiro álbum da banda foi produzido por Miguel Castro, o homem da guitarra eléctrica, e editado pela Sony Music. Dele constam alguns originais e muitos temas revisitados e reinventados. Maria João Silva, Miguel Castro, Nuno Faria, André Lentilhas e Luís Gaspar abriram o armário da pop de ouro, dos anos 40 e 50, sacudiram o cheiro a naftalina e transformaram êxitos de outrora em temas actuais. E o som d’Os Eléctricos faz-nos duvidar se aquilo que estamos a ouvir são efectivamente músicas de outro tempo ou de agora.
A tour de inverno tem conhecido momentos calorosos, junto de um público que a própria banda desconhecia: «tem sido uma agradável surpresa descobrir quem é o público d’Os Eléctricos; conseguimos perceber que chegamos a pessoas de todas as idades» - partilharam connosco o André Lentilhas e o Luís Gaspar. Se as músicas são conhecidas dos graúdos, o ritmo mexe com os miúdos e dá-lhes a conhecer a música de nomes como Tony de Matos ou João Villaret.
Para Nuno Faria, Os Eléctricos traduzem-se efectivamente numa viagem ao passado e connosco recordou as matinés no Ginásio Clube de Português. Basta ouvir a música «Boite do Estoril» (que contou com a participação especial do Rui Reininho) para regressarmos a um ontem que, à conta desta banda, acontece hoje e amanhã. 
«Anda um cupido a voar por aqui» - canta Maria João Silva, acompanhada por quatro músicos que carregam consigo influências como o jazz, o rock e os blues. E é essa mistura que nos revela uma banda a quem reconhecemos uma identidade portuguesa, sobretudo quando se pega em músicas como Suspicious Minds, do «fadista» Elvis Presley e se canta com o sentimento de quem usa o xaile aos ombros e diz «obrigada, obrigada».
A banda tem vindo a percorrer o país em concertos, tendo no dia 10 de Fevereiro visitado o Centro Cultural Olga Cadaval, aquecendo as almas,as mãos e as vozes do público presente. André Lentilhas dizia-nos que Os Eléctricos são, sobretudo, uma fonte de divertimento e de convívio. Considerem que a missão, no Olga Cadaval, foi cumprida: entretenimento e diversão foram as palavras de ordem.



Próximas datas da Tour de Inverno:
Dia 02 de Março  às 22h00 - Lisboa, Auditório Carlos Paredes (J.F.Benfica)
Dia 03 de Março  às 22h00 – Sesimbra, Cine Teatro João Mota


Quem são Os Eléctricos?

Voz Maria João Silva
Guitarra Miguel Castro
Banjo e Guitarra Dobro André Lentilhas 
Contrabaixo Nuno Faria 
Bateria Luís Gaspar


sábado, 11 de fevereiro de 2012

Da irmandade à sede de poder e de ambição | Sobre AGORA, de Alejandro Amenabar, 2009


Amenabar tem tido uma carreira muito própria na realização, tendo-nos presenteado com  verdadeiras obras de culto como Thesis (1996) ou Abre los Ojos (1997 – este filme foi a base do êxito Vanilla Sky, uns anos mais tarde).  2004 é o ano  da consagração com o Óscar de Melhor Filme Estrangeiro, pela película Mar Adentro. Em 2009 regressa com um filme em inglês, baseado na vida de Hipácia de Alexandria.

Hipácia foi uma filósofa e astrónoma de Alexandria, de quem nos chegaram apenas as palavras dos seus discípulos e o reconhecimento da importância do seu pensamento.  Preocupava-a o porquê das coisas e as respostas que não tinha para aquilo que lhe era desconhecido. E essa inquietação do ser é muitíssimo bem representada pela actriz que lhe dá corpo e alma em Agora, a britânica Rachel Weisz. 

O filme tem a mestria de nos colocar no centro do mundo, mundo esse que tem vindo a fazer justiça às palavras de Heraclito, que terá afirmado que a guerra é a mãe de todas as coisas. E é precisamente a guerra entre pagãos, cristãos e judeus que Amenabar ilustra em Agora. É revoltante assistir à destruição da biblioteca de Alexandria (quantos e quantos ensaios e estudos e pensamentos não terão sido perdidos no saque do ano 389). 

Hipácia interrogava-se (e conduzia quem a rodeava nesse caminho interrogativo) sobre o espaço que a Terra ocupava no mundo, interrogando-se sobre a imperfeição das coisas e a perfeição do círculo. Que forma perfeita subjaz a tudo isto? Esta pergunta era partilhada com os seus discípulos, mas também com os escravos que a acompanhavam.

A filósofa foi vítima dos fanatismos que opunham os cristãos, os judeus e os pagãos; foi ainda vítima da sua condição de mulher que incomodava por ter um lugar como conselheira de Orestes, o prefeito.
Não tem a espectacularidade nem o orçamento de Avatar; não tem as super star de Sherlock Homes; Agora apresenta-nos de forma simples, lúcida, como uma faísca de ódio pode destruir uma Biblioteca, vidas humanas, pensamento, relações, emoções, vontades, perguntas e inquietudes. É um retrato fiel e cru da forma como a humanidade tem vindo a «evoluir»: quando há receio perante o  que não conhece, a resposta é a violência.  

(trabalho realizado para a Webzine Muro)

Chorar e Secar | Teatro Turim


Duas mulheres, duas cadeiras, uma mesa, dois monólogos. Não há conversa em cena. O diálogo  não existe. À primeira vista, pois na vida real estes monólogos cabem muito bem naquela conversa que eu ou tu ou aquele ou o outro temos com alguém.
Os lábios (de vermelho pintados) contam-nos duas estórias de vida, de adaptação ao mundo. Estórias contadas na primeira pessoa, aliás, nas primeiras duas pessoas que são as actrizes Anabela e Margarida Moreira. Vive-se nesta peça um interessante jogo de diferenças e semelhanças com a particularidade das actrizes serem gémeas. Esse é um dos pontos de união entre estas duas mulheres que, segundo o autor Fernando Villas-Boas, não se conhecem.
Conversamos com Raquel Dias, a encenadora, que nos falou da origem da peça. «Este texto foi uma «encomenda» que fiz ao Fernando, há já algum tempo. Mas ficou na gaveta, pois era um projecto para se ir fazendo.». A oportunidade de trabalho e parceria entre o Teatro Turim e a Voz Humana fizeram com que Chorar e Secar ganhasse corpo para ver a luz da estreia no passado dia 3 de Novembro.
Raquel Dias falou-nos, ainda, da forma convencional, mas eficaz, do processo de encenação e salientou o espírito de generosidade da equipa envolvida neste projecto. O teatro é um espaço onde a generosidade é comum e contagiosa (no bom sentido).
Chorar e Secar é uma peça sobre a dor. As dores de todos nós. E todos nós temos dores, ainda que as sintamos de forma diferente. O texto de Villas-Boas evoca essa semelhança e diferença, num cenário circunstancial de encontro entre duas mulheres. Mulheres decorativas, mulheres antagónicas, mulheres que procuram, mulheres que se acomodam. Mulheres que usam a máscara para fora e para dentro, vivendo a ilusão e a auto-ilusão, como quem se maquilha à pressa, para não chegar tarde áquele encontro.
O teatro pode muito bem ser definido como um convite à entrada num outro plano de existência. Até ao dia 27 de Novembro, o Teatro Turim convida-vos a entrar na existência confessional  de Mena e Luísa.

(trabalho realizado para a Rua de Baixo | Novembro de 2011)